quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

A felicidade de uma noite de inverno...

Cada vez me convenço mais que fui feita para os outros.

Há dias, aqueles muito gelados, em que temos a lareira acesa, a casa quentinha, mas algo mais forte que se levanta: o dever, a disponibilidade, o trabalho, a ajuda, a amizade e então veste-se um casaco grosso, põe-se um cachecol e calça-se umas luvas, prega-se o cartão de identificação e empunha-se a pasta. Olha-se uma última vez para a salamandra acesa, despedimo-nos da casa quentinha com um "até já" e sai-se para a rua.

Eu já sei que as pessoas são fantásticas mas ontem tive uma prova de quanto é gratificante cuidar, olhar, ouvir, escutar, tocar... O que descrevi acima foi o que me aconteceu ontem. Depois das 5h30, por uma questão de acessibilidade ao horário daquelas mulheres, que trabalham e que imagino, durante o caminho, como me vão receber. Admito que ontem, apesar de já pensar desde manhã que tinha de o fazer, era um dos dias em que o frio me rasgava a pele, em que me apetecia ficar ao calor da minha salamandra, mas tinha de ser e já me diz a minha avó "o que tem de ser tem muita força, mais força do que o apetece fazer". Saí de casa, apetrechada, aprontei me cheia de roupa, mas tendo sempre em atenção se causaria ou não desconfiança nas pessoas aquela minha vestimenta. Troquei de roupa bastantes vezes, queria acompanhar o meu sorriso de um aspecto que inspirasse confiança. Saí de casa, as primeiras moradas revelaram-se infrutíferas, não me atendiam mas, não sei se pelo meu optimismo e vontade, eu ansiava pela próxima casa. Até que me atendem, mas teimam em não querer participar, tento ser firme e explicar a importância de ser ela e não outra mulher, e aí marca me para mais tarde. Ok, siga viagem...A vizinha, mesmo do lado, também estava na minha lista, toquei e a senhora atendeu-me e diz "minha querida, entra, está tanto frio, anda pra lareira". É de sublinhar que, apesar de sermos quase vizinhas, nem ela me conhecia, nem eu a ela, e ela acolheu me de forma tão calorosa. Levou me até à sua sala e saiu da divisão acolhedora, quente e familiar. Quando entra novamente na sala, traz uma manta que me coloca nas costas e me diz "eu ate poderia desconfiar, mas esse teu sorriso não engana ninguém, só podes ser boa pessoa, vamos lá ao teu trabalhinho". Fiz o que o propósito da visita exigia, e tivemos uma óptima conversa. Tive boas surpresas, passamos a conhecer nos e ainda tive um convite para um chá, que delicadamente recusei.

Isto tudo para dizer que aquela senhora, aqueceu me por fora, mas muito mais por dentro, a vizinha que visitei depois, revelou se uma vez mais também uma óptima pessoa e as casas que visitei e nas quais me atenderam, parece que percebiam o que eu tinha sentido ao sair do calor da minha casa e queriam aquecer-me...o coração! E conseguiram...cheguei a casa mais feliz que uma criança depois de receber um doce. Tomei um banho que me repôs o calor e energia do dia, lembrando-me a cada pingo de água que me escorria pelo corpo, das palavras calorosas que tinham ouvido naquele pequeno espaço de tempo.

Já tinha tido experiências lindas com as pessoas, mas esta iniciativa, este trabalho que tanto gosto me tem dado está a superar tudo o que eu imaginava que podia receber das pessoas. E aí percebo que a melhor contrapartida que podemos receber quando cuidamos das pessoas, é o seu sorriso, o seu carinho, a sua atenção, aquele seu olhar que diz "obrigado" a cada pestanejar.

Como eu adoro aquilo que fui, sou e serei futuramente enquanto enfermeira.

E a quem me proporciona tudo isto...OBRIGADO!

1 comentário:

  1. Minha querida Tânia.
    Como te compreendo. Sei a que trabalho e situações te referes e por isso fico tão, mas tão satisfeita por algo que eu sou responsável estar a proporcionar algo interessante para as pessoas que trabalham comigo. Já tantas vezes o tenho dito que temo ser repetitiva. mas a alegria e o calor que sentiste é o mesmo que eu sinto com as tuas palavras. Aquecem-me por dentro... Tb me sinto tentada a deixar-me convidar pelo calor da minha casa e permanecer nela, mas sabes o que já me acontece?
    Acho que me tornei dependente das entrevistas... Na semana que não as faço sinto falta do contacto humano dessa gente. Tb me tem acontecido coisas espantosas. O meu trabalho tem transmitido um prazer muito para além daquilo que seria expectável. Apesar de todos os contratempos, o que se "ganha" suplanta em muito tudo o resto.
    Não tenho mais palavras. Mas concordo que isto tem aquecido o meu Inverno de uma forma humana e incrível, por tudo aquilo que me é sagrado. Por mim todos os dias andava na rua para poder ouvir as pessoas... histórias de vida... Tudo o que me quiserem contar. Adoro poder pensar que saio das suas casas com algo que cumpri para mim, mas acima de tudo, com algo que dei aos outros.
    É de tudo isto que tenho saudades na prestação de cuidados...
    Obrigada por dares a conhecer o que sentes.
    Bjs cheios de carinho e ternura por alguém que sabe ser.
    CF

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